Pela manhã
Pela manhã um pouco depois
das cinco
ainda na escuridão da noite
com o friozinho
da madruga
que faz o cara da rua
se cobrir da cabeça aos pés
de cobertor e papelão
– nunca o ouvi roncar,
nem se mexer- também nunca o vi
de dia -Viro a esquina
e cruzo com as duas amigas
que vão para a fábrica de calcinhas
(é claro que elas não estão de calcinha,
ou melhor, estão..., bem, acho que estão...,
ou melhor dizendo – elas trabalham
em uma fábrica de calcinha)
Depois cruzo com uma outra retardatária,
sempre com seus jeans,
sua bolsa de 9,90
e seu cheiro de AVON DO DIA 5
Nesse horário a Guaicurus
é tão vazia que a cruzo de olhos fechados,
tão vazia que
os ônibus erram o itinerário
e tomam a contra mão da Aurélia.
O bar recende a enroladinho de salsicha
em óleo rançoso.
Remendei as solas dos meus sapatos
cortando parte do calcanhar.
Remendei com uma “Bond-Pirata”
debaixo da escada,
escondido para minha mulher
não ver- Pobre Churi, pobre vida!
A professorinha disse não saber porque
o Will Eisner desenha todo mundo com os sapatos furados.
Fiquei com vergonha de levantar o pé e mostrar
como isso funciona!
Continuo o caminho como
se pisasse em dois grandes chicletes,
ou em merda dura,
uma em cada pé.
Torço para logo me acostumar.
A banca de bolos na entrada
da estação o café fumega. Já
parei ali em outras épocas quando 1 real
era alguma coisa.
Hoje cada passo – cada mísero
passo é para o aluguel.
Na plataforma o trem já
vem cheio de Itapevi,
ainda mais cansados do que eu
ainda muito mais corajosos do que eu...
Todos na lida...
Na Barra Funda
todos a tomar seus rumos
e
eu sigo martelando um verso
e com a esperança de que o sapato
aguente
um pouco mais.
Um comentário:
Eu quero um desenho meu com o sapato furado. Melhor ainda, o desenho dos quatro lá do Oratório, todos com sapatos furados. Depois acertamos os detalhes. Segunda colo no patrão. Dia de folga, dia de litrão...
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